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Decisões judiciais e arbitrais

Newsletter Fiscal Portugal - Dezembro 2019

IVA – A isenção prevista para as operações de concessão, de negociação ou de gestão de crédito não se aplica a cedências a terceiro da posição processual que o sujeito passivo detenha numa ação executiva para a cobrança de um crédito reconhecido judicialmente (Acórdão do Tribunal da Justiça da União Europeia de 17 de outubro de 2019, Processo C-692/17)

Neste acórdão, o Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) interpreta a isenção de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) relativa às operações de concessão, de negociação ou de gestão de crédito no sentido de a mesma não se aplicar às operações em que o sujeito passivo ceda a um terceiro, a título oneroso, todos os direitos e obrigações decorrentes da posição processual numa ação executiva para cobrança de crédito reconhecido judicialmente e cujo pagamento tenha sido garantido por um direito sobre um bem imóvel penhorado.

O pedido de intervenção do TJUE foi apresentado no âmbito de um litígio entre uma sociedade portuguesa e as autoridades fiscais portuguesas. No caso concreto, a sociedade, que prosseguia atividades de mediação imobiliária, dispondo de um mandato exclusivo de venda de um terreno agrícola, tinha apresentado uma proposta de compra ao mandante, o qual tinha rejeitado e recusado a pagar a remuneração acordada pelo serviço prestado. Após a condenação no pagamento das comissões e de ter sido interposta ação executiva onde foi penhorado um imóvel do devedor, como garantia do pagamento do montante devido, a sociedade procedeu à cessão de todos os direitos e obrigações decorrentes da sua posição na ação executiva.

Apesar de ter sido liquidado IVA de parte do montante pago pela cessionária, relativamente à contrapartida dos serviços de intermediação prestados, a entidade portuguesa não liquidou IVA sobre o remanescente preço da cessão. A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), por seu turno, considerou que a cessão da posição contratual não teria sido corretamente contabilizada, pois constituía uma operação distinta da comissão de intermediação imobiliária.

Atendendo às circunstâncias na origem do litígio no processo principal, o TJUE concluiu que a operação em apreço não se encontrava abrangida pela isenção prevista no artigo 135.º, n.º 1, alínea d) da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006 (“Diretiva IVA”), transposta para o artigo 9.°, n.º 27, alíneas a) e c) do Código do IVA, porquanto não se estava perante um “crédito” consistente na disponibilização de determinado capital, devidamente remunerado pelo pagamento de juros, ou no pagamento diferido do preço de compra de um bem, consentido por um fornecedor, mediante o pagamento de juros remuneratórios desse crédito.

IRC – O Tribunal Arbitral analisou a dedutibilidade dos gastos despendidos por uma entidade de mediação imobiliária à luz do artigo 23.º-A, n.º 1, alínea r), do Código do IRC (Decisão Arbitral proferida no âmbito do Processo n.º694/2018-T, de 19 de junho de 2019)

Na decisão em apreço, o Tribunal Arbitral aferiu se os gastos despendidos por uma entidade de mediação imobiliária em Hong Kong constituíam encargos fiscalmente dedutíveis, nos termos do mencionado artigo do Código do Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”).

No processo em análise, a Requerente tinha contabilizado em 2014 faturas emitidas por empresas com sede em Hong Kong referentes a serviços de marketing, pesquisa de mercado, consultoria e publicidade na China. Estavam em causa prestações de serviços de angariação de clientes residentes na China, realizados por empresas sedeadas em Hong Kong, com vista à aquisição de imóveis em Portugal com intermediação da Requerente.

A AT, em sede de inspeção tributária, não aceitara a dedução dos gastos, nos termos do artigo 23.º-A, n.º 1, alínea r), do Código do IRC vigente à data dos factos, tendo ainda liquidado a correspondente tributação autónoma, prevista no artigo 88.º, n.º 8, do Código do IRC, atendendo a que Hong Kong encontrava-se incluído na lista de países, territórios e regiões com regimes de tributação claramente mais favoráveis. No relatório de inspeção, a AT invocou que o sujeito passivo deveria ter provado que os gastos correspondiam a operações efetivamente realizadas e que não tinham um caráter anormal ou um montante exagerado, i.e. que os gastos se materializavam em atos efetivos, não bastando a mera existência formal de contratos, faturas e transferências bancárias, e que constituíram uma justa remuneração dos serviços quando comparados a serviços análogos.

Na sua análise, o Tribunal Arbitral entendeu que resultou da prova produzida que a atividade realizada pelas empresas de Hong Kong visara a angariação de cidadãos residentes na China para compra de imóveis com intermediação da Requerente. A atividade de angariação era acompanhada pelo pagamento das despesas de viagens e estadia dos cidadãos angariados e a remuneração daquelas empresas era efetuada apenas quando concretizadas as vendas. Para o Tribunal, o aumento das vendas constitui prova convincente de que as operações foram realizadas, caso contrário os clientes não teriam conhecimento de que a Requerente dispunha dos imóveis em causa.

No que respeita à prova da “não anormalidade” e “não exagero” da prestação, o Tribunal entendeu que constituía prova suficiente o facto da atividade subjacente ser regulamentada e não gratuita, não devendo o preço ser exagerado atendendo à situação do sujeito passivo e à sua atuação, nomeadamente, quando possível demonstrar que poderia obter o mesmo serviço por quantia inferior. Nesta medida, entendeu que a angariação de clientes para a aquisição de imóveis constituía uma atividade de prestação de serviços regulamentada e remunerada. Já no que respeita ao critério do “não exagero”, invocando a exigência de uma análise casuística, justificada com base em critérios de razoabilidade, o Tribunal concluiu que o exercício de razoabilidade não podia ser comparável com as percentagens de comissões cobradas habitualmente pelas empresas de intermediação imobiliária nacionais.

Em suma, o Tribunal Arbitral concluiu que os gastos despendidos nos pagamentos efetuados às empresas de Hong Kong, derivado da intermediação imobiliária, constituíam gastos dedutíveis, nos termos do artigo 23.º n.º 1, alínea r), do Código do IRC e que não se encontravam sujeitos a tributação autónoma de acordo com o artigo 88.º, n.º 8, do Código do IRC. 

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