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A Importância da Estabilidade de da Confiança

Miguel Marques dos Santos

O mundo do imobiliário tem vivido tempos conturbados desde 2008. Em Portugal, apesar de logo desde 2008 se ter sentido um abrandamento significativo, o momento mais grave para o sector imobiliário foi o ano que se seguiu à assinatura do memorando de entendimento entre o Estado Português e a Troika, do Verão de 2011 ao Verão de 2012.

Não é que o memorando em si tenha sido o problema (bem pelo contrário, ele pode ter constituído o principio da solução), mas o momento da sua assinatura foi o momento em que ficou clara para todos a verdadeira situação do país e a sua fragilidade económico-financeira, com a inerente retracção do investimento e do consumo e as invitáveis consequências recessivas.

Nesse ano fatídico, os investidores institucionais (especialmente os internacionais), entenderam que o risco-país estava muito para além do razoável e pura e simplesmente desistiram de Portugal, com consequências imediatas no mercado de investimento, e os consumidores mediram o risco-país à sua maneira e concluíram pela necessidade de esperar para ver, o que levou a uma completa paralisação do mercado da promoção.

O resultado desta falta de confiança foi claro: no ano de 2012, no momento em que batemos no fundo, as transacções de investimento com alguma relevância não ultrapassaram uma dúzia, com um volume total de investimento que, segundo algumas estatísticas, não terá ultrapassado os 100 milhões de euros (contra os cerca de 1.400 milhões de 2007), e as vendas no mercado da promoção pura e simplesmente deixaram de existir (com algumas excepções pontuais, ligadas as aspectos específicos de determinados empreendimentos). Ou seja, em 2012 o investimento desceu para valores históricos e as transacções individuais caíram a pique.

A questão que agora se coloca é a de saber qual o caminho para ultrapassar o momento difícil em que que o sector se encontra: se a solução passará mais por introduzir reformas estruturais e criar incentivos do Estado ou outro tipo de apoios; se a solução passará mais por garantir a estabilidade política e económica necessária para diminuir a percepção do risco-país e aumentar a confiança; ou se a solução passará por uma combinação de todos estes aspectos.
Quanto às reformas estruturais e à criação de incentivos do Estado e de outro tipo de apoios, o Governo deu já passos muito relevantes. Senão vejamos: ainda em 2012 foi feito um esforço significativo por parte do Governo (em grande parte, aliás, em cumprimento do estabelecido no memorando de entendimento), para implementar reformas estruturais essenciais para o sector (de que são bons exemplos, a reforma do regime da reabilitação urbana e a reforma do regime do arrendamento urbano). A par destas reformas estruturais, foi sendo progressivamente criado um pacote de incentivos fiscais à reabilitação urbana, em sede de IVA, IRC, IRS, IMI e IMT, que poderão ser de extrema relevância para o relançamento desta actividade. Por outro lado, o Governo está, desde finais de 2012, a implementar diversos programas e medidas (de que são bons exemplos, o programa “Living in Portugal”, o regime dos “Golden Visa” e o “Regime Fiscal dos Residentes não Habituais”), que certamente contribuirão para atrair investimento estrangeiro e, consequentemente, para escoar o excesso de produto imobiliário existente. É certo que existem ainda reformas estruturais muito relevantes por fazer, como é o caso da Reforma do Estado e da Reforma dos Processos de Licenciamento (no sentido da respectiva simplificação), as quais terão forte relevância no sector imobiliário, mas tudo indica que estas reformas estão em curso e serão implementadas num futuro muito próximo.

Em resumo: quanto às reformas estruturais, embora seja sempre possível e desejável fazer mais, as reformas já implementadas e as que serão implementadas a breve trecho parecem ser as adequadas e suficientes para promover os factores de sucesso relevantes: concentração na reabilitação em detrimento da construção nova, criação de novos canais de escoamento do excesso de stock existente e eliminação (ou redução) dos custos de contexto na actividade da promoção.
Mas estas reformas, embora extremamente importantes, só darão frutos a médio / longo prazo. A situação que vivemos no ano de 2012 tem muito mais a ver com os problemas estruturais da economia (que levaram ao aumento do risco-país, à crise da dívida, à quebra do investimento estrangeiro e à quebra do consumo), com reflexos no sector imobiliário, do que a problemas específicos do sector imobiliário. Não há sector que sobreviva sem financiamento, sem investimento e sem consumo, e o sector imobiliário não é excepção. 

E por isso é forçoso concluir que as chaves do sucesso, neste momento, são a estabilidade política e económica, a diminuição da percepção do risco-país e o aumento da confiança. Só assim se potenciará o financiamento, o investimento e o consumo. A experiência recente, desde a segunda metade 2012 até agora, tem demonstrado isso mesmo. Neste período, o mercado de investimento tem mostrado um claro padrão de recuperação (infelizmente ainda não extensível ao mercado da promoção, que depende mais da confiança interna do que da confiança dos investidores internacionais). Este padrão de recuperação está claramente associado com o desenvolvimento positivo do risco-país, também desde o Verão de 2012 (como o demonstra a tendência de redução dos juros da dívida soberana portuguesa desde essa altura). Os investidores interiorizaram, nesse momento, que Portugal tinha um rumo financeiro certo, que cumpria sucessivamente as avaliações da troika, que tinha a estabilidade política necessária para implementar as reformas estruturais previstas no memorando, e isso teve reflexos imediatos nos juros da dívida (ainda que com um empurrão do BCE) e na vontade dos investidores de voltarem a ver Portugal como um destino de investimento. Numa primeira fase, na segunda metade do ano de 2012, o interesse manifestado pelos investidores não institucionais foi evidente (essencialmente investidores brasileiros e family offices europeus, que entenderam que o risco-país estava já num nível aceitável e  não quiseram perder as oportunidades que o mercado ia proporcionando. Depois, numa segunda fase, já este ano, os investidores institucionais voltaram a olhar para o mercado português, não querendo ficar para trás num mercado que começa a dar sinais de recuperação.     

Parece óbvio que o caminho está na criação de um clima de estabilidade e de confiança. O desafio que agora se coloca é o de saber se os nossos políticos estão à altura do momento, e conseguem manter a coesão e o rumo. Se for esse o caso, o investimento continuará a crescer de forma sustentada e o caminho aberto pelas reformas estruturais já implementadas dará certamente frutos num futuro mais ou menos próximo.